sexta-feira, 12 de agosto de 2022

Leitura da Carta reúne Brasil em torno da defesa da democracia

 


Um som ecoou do Prédio Histórico da Faculdade de Direito da USP, no Largo de São Francisco. O momento de repúdio aos ataques à democracia brasileira, levou a SanFran a tomar seu lugar histórico de defesa às garantias jurídicas e constitucionais.

No Pátio das Arcadas, tomado por signatários da Carta de 1977, representantes de todas as áreas da sociedade civil, jornalistas, estudantes, professores, empresários e tantos outros profissionais, a leitura da “Carta às Brasileiras e aos Brasileiros – Estado Democrático de Direito Sempre” deixou claro que não há mais espaços para retrocessos.

No evento, transmitido por emissoras de rádio e de televisão, pelo canal do YouTube da FDUSP, as professoras Eunice Prudente, Ana Elisa Liberatore Bechara e Maria Paula Dallari e o jurista Flávio Bierrenbach leram o documento, que está perto de alcançar a marca de 1 milhão de signatários, enquanto a plateia acompanhava o ato dentro e fora do Edifício. O Largo lotou, por milhares de pessoas.

Neste ato, a primeira fala coube a presidente do Centro Acadêmico XI de Agosto, Manuela Morais. “Não há dúvidas do marco histórico que a presença de cada um aqui representa. Como a primeira entidade estudantil fundada no Brasil, consideramos que era preferível que não houvesse, após 45 anos, a necessidade de uma nova Carta aos Brasileiros”, disse.

Primeiro momento

A manifestação foi dividida em dois momentos. A primeiro, no Salão Nobre, com a leitura do Manifesto em Defesa da Democracia e da Justiça, articulada pela Federação da Indústria do Estado de São Paulo, com 107 entidades.

Ex-ministro da Justiça, José Carlos Dias leu o texto do primeiro ato, destacando a união de empresários e trabalhadores em defesa da democracia. “Hoje é um momento inédito em que capital e trabalho se unem em defesa da democracia”, ressaltou.

Os trabalhos no Salão Nobre foram abertos pelo Reitor da Universidade de São Paulo, Carlos Gilberto Carlotti. “Estamos aqui para defender a legislação eleitoral, a justiça eleitoral e o sistema eleitoral, com as urnas eletrônicas. Que a vontade do povo brasileiro seja respeitada e seja soberana”, disse.

Ao encerrar o primeiro ato, Celso Fernandes Campilongo, diretor da Faculdade de Direito da USP, lembrou a movimentação em torno da defesa da democracia e fez aproveitou para homenagear o professor Sênior da FDUSP José Afonso da Silva. “Em nome de todas as pessoas quero fazer uma homenagem muito singela a um dos maiores professores e constitucionalista do Brasil. Alguém que sabe muito bem o que é o sistema eleitoral, quais são as instituições que regulamentam, finalizam e tem competência para declarar quem venceu as eleições, alguém que conhece bem o sistema eleitoral brasileiro”, disse. (Kaco Bovi)

Leia a carta na íntegra

Em agosto de 1977, em meio às comemorações do sesquicentenário de fundação dos Cursos Jurídicos no País, o professor Goffredo da Silva Telles Junior, mestre de todos nós, no território livre do Largo de São Francisco, leu a Carta aos Brasileiros, na qual denunciava a ilegitimidade do então governo militar e o estado de exceção em que vivíamos. Conclamava também o restabelecimento do estado de direito e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.

A semente plantada rendeu frutos. O Brasil superou a ditadura militar. A Assembleia Nacional Constituinte resgatou a legitimidade de nossas instituições, restabelecendo o estado democrático de direito com a prevalência do respeito aos direitos fundamentais.

Temos os poderes da República, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, todos independentes, autônomos e com o compromisso de respeitar e zelar pela observância do pacto maior, a Constituição Federal.

Sob o manto da Constituição Federal de 1988, prestes a completar seu 34º aniversário, passamos por eleições livres e periódicas, nas quais o debate político sobre os projetos para país sempre foi democrático, cabendo a decisão final à soberania popular.

A lição de Goffredo está estampada em nossa Constituição “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

Nossas eleições com o processo eletrônico de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça Eleitoral.

Nossa democracia cresceu e amadureceu, mas muito ainda há de ser feito. Vivemos em país de profundas desigualdades sociais, com carências em serviços públicos essenciais, como saúde, educação, habitação e segurança pública. Temos muito a caminhar no desenvolvimento das nossas potencialidades econômicas de forma sustentável. O Estado apresenta-se ineficiente diante dos seus inúmeros desafios. Pleitos por maior respeito e igualdade de condições em matéria de raça, gênero e orientação sexual ainda estão longe de ser atendidos com a devida plenitude.

Nos próximos dias, em meio a estes desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos visando convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos próximos anos.

Ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições.

Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o estado democrático de direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional.

Assistimos recentemente a desvarios autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das eleições não tiveram êxito, aqui também não terão.

Nossa consciência cívica é muito maior do que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar ao lado divergências menores em prol de algo muito maior, a defesa da ordem democrática.

Imbuídos do espírito cívico que lastreou a Carta aos Brasileiros de 1977 e reunidos no mesmo território livre do Largo de São Francisco, independentemente da preferência eleitoral ou partidária de cada um, clamamos as brasileiras e brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições.

No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições.

Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas, bradamos de forma uníssona:

Estado Democrático de Direito Sempre!!!!




fonte: https://direito.usp.br/

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